Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Angola - Uma relação distorcida entre a ética, o direito e a política

Este é o ponto em que tenho batido e rebatido, especialmente a partir do momento em que entidades respeitáveis passaram a achar naturais e normais as propostas de grave alteração dos princípios fundamentais da “constituição constituinte” de 1992, para a aprovação da actual Constituição (2010), a formalizar e reforçar os poderes excessivos que o já longevo Presidente Eduardo dos Santos detinha materialmente, devido ao prolongamento da guerra civil.

Nessa altura, alguns partidos políticos da oposição, certamente, por anúncio de alguma vantagem passageira, contribuíram para a aprovação quase unânime de uma constituição que, na base da manobra política, desconsiderava toda a ética de convivência humana e política e o dispositivo jurídico que lhe dava sustentação, no sentido de consolidar a propalada “Reconciliação Nacional”. Antes, os próprios militantes e dirigentes do partido no poder, também apanhados de surpresa, não puderam senão vergar-se à surpreendente realidade, com um estrondoso conformismo.

Alegra-me hoje que, pelo menos ao nível de todas as bancadas parlamentares, através de uma declaração que acabo de ler, haja um consenso em torno do último pacote legislativo relativo às próximas eleições, sobre a sua total ir-razoabilidade no plano ético e jurídico, quando se pensa que a maioria qualificada de um parlamento pode decidir tudo, desde que seja necessário para o alcance dos objectivos políticos do partido de onde emana.

Estes atropelos sucessivos a princípios éticos elementares na política, já não deveriam ser tolerados, há mais de uma década do fim do conflito que nos dividiu. E devem preocupar os próprios militantes e deputados do MPLA, porque assim se continuando, não haverá reconciliação nacional e sem reconciliação não podemos dormir sossegados em relação ao nosso futuro.

A manobra política também tem os seus limites éticos e nunca deve ultrapassar, como muito bem o sugere a declaração dos grupos parlamentes da oposição, o círculo jurídico mais ou menos largo que os definem. Para que servem os chamados “limites materiais” de uma constituição?

Mas todas essas ir-razoabilidades só revelam um aspecto em que tenho igualmente insistido: Angola e muitos outros países africanos precisam de criar um ambiente em que ninguém se derreta de medo por, eventualmente, perder eleições. E isso exige um debate franco que, com poucas excepções, nunca se fez nem antes nem depois do colonialismo. Marcolino Moco – Angola in “Moco Produções”

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