Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

sábado, 25 de abril de 2015

Índia - Pablo Bartholomew, a herança de Goa em Lisboa

O fotógrafo indiano três vezes vencedor do World Press Photo está em Portugal para documentar a comunidade goesa que imigrou nos anos 60 e 70.

Aos 15 anos, Pablo Bartholomew era expulso da escola onde estudava em Nova Deli. Nada que fosse um problema quando havia uma máquina fotográfica por perto. O pai era “o que hoje em dia se chama curador” e também costumava fotografar e a mãe, “ligada ao cinema e ao teatro”, ajudava ao ambiente artístico que se vivia em casa. À falta de escola, há sempre a fotografia.

Estamos na esplanada do restaurante Eduardo das Conquilhas, na Parede, e Pablo Bartholomew recorda o seu passado na Índia, onde cresceu e onde ainda vive. “Queria experimentar a comida goesa aqui, mas o outro restaurante [goês, também na Parede] estava fechado”, diz enquanto encara a vitela que tem no prato. Vitela num restaurante de conquilhas? Bem, terá tempo para as experimentar noutra visita.

Recomendamos-lhe o Jesus é Goês, em Lisboa, onde talvez encontre o que procura, o prato mais picante de Lisboa, o caril de caranguejo, típico da cozinha indo-portuguesa. Nos próximos três meses, o fotógrafo vencedor também três vezes do World Press Photo vai estar na cidade para fotografar a comunidade goesa que imigrou para Portugal em 61, “depois da independência da colónia”, explica. O caril de caranguejo certamente terá de fazer parte da ementa da visita. Mas isso fica para outro dia.

O projecto que vai desenvolver em Lisboa, uma continuação da série “The Indian Emigrés”, que começou nos Estados Unidos, não é novo. Aliás, tem praticamente a nossa idade.“Comecei-o em 1987, dois anos depois de o meu pai morrer”, conta. “Na altura tinha 30 e tal anos e comecei a questionar várias coisas na minha vida. O meu pai nasceu na Birmânia, foi-se embora para a Índia ainda criança, durante a Segunda Guerra Mundial, e nunca mais regressou. Nunca deixei de pensar nas origens dele e em como seria a adaptação das pessoas a outra cidade, com a comida, a religião, as roupas e todos os hábitos diferentes.”

Nos anos 80 as suas inquietações levaram-no à Califórnia, onde conheceu “dos indianos que lideravam grandes empresas de tecnologia à comunidade sique de agricultores do Norte, numa altura em que se consumia muita comida enlatada, de fruta a legumes”, explica.

Antes disso, já tinha vencido o World Press Photo com apenas 20 anos. “Na verdade, quando tirei as fotos vencedoras tinha 19 anos”, recorda. Valeu a pena faltar às aulas.

“Foi com uma série sobre viciados em morfina e não foi muito difícil consegui-la”, conta. “De facto aquele ambiente era o que me rodeava nesses tempos mais hippies.” Em 1984 voltou a vencer o World Press Photo, com uma série sobre o desastre industrial da fábrica de pesticidas em Bhopal. Uma das fotos, a de uma criança morta, foi considerada Foto do Ano e correu o mundo.

Ainda assim, e apesar do reconhecimento, o dinheiro não lhe chegava aos bolsos. “Mesmo depois do prémio continuei a trabalhar como fotógrafo em rodagens de cinema”, continua. “Depois disso trabalhei em publicidade e foi aí que consegui ganhar dinheiro. Mas tive de deixar porque isso mata-nos a cabeça.”

Melhores tempos ainda viriam e os trabalhos de freelancer começaram a suceder-se em várias revistas importantes, da “National Geographic” à “Paris Match”, passando por jornais como o “Figaro” ou o “New York Times” numa altura de crescimento da Índia. “Posso dizer que vivi a era de ouro do fotojornalismo, que deve ter acabado ali por 1995 ou 1996”, opina.

Quanto ao trabalho sobre as comunidades fora da Índia deixou-o “adormecido” no fim dos anos 80 “por falta de dinheiro”. “Em 2009 arranjei dinheiro para o recomeçar em França, com uma bolsa do Museu Quai Branly”, conta. “Queria olhar para as comunidades que vieram das ilhas francesas, como a Martinica ou Guadaloupe, para onde muitos indianos foram num trabalho praticamente escravo.”

Seguiu-se Leicester, no Reino Unido, e agora Lisboa, onde vai estar até ao início de Julho com uma bolsa da Fundação Oriente. “Estou mais interessado nas pessoas que vieram nos anos 60 e nas que vieram mais tarde, nos anos 70, de Moçambique”, conta. Já tem uma rede de contactos e o trabalho vai começar nos próximos dias. Clara Silva – Portugal in “Jornal I”

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