Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Galiza - A bandeira nacional da Gallaecia

Palavra comum é uma publicação dirigida a fazermos comum um espaço de cultura, além de fronteiras artificiais. Permita-se-me logo recuperar para ela uma nota vivencial que junta tudo em termos de vida, do que se faz vivendo: comer, viajar, falar, sonhar com as pálpebras fechadas ou abertas.

Há mais de sete anos que a escrevi a gentil demanda do Eixo Atlântico, conformado pelas principais cidades da euro-região Galiza-Norte de Portugal. E ainda vale, como valerá, porque as circunstâncias essenciais não mudaram.

Contudo, já fecharam três negócios que juntavam galegos e portugueses na capital da União Europeia: o restaurante Madredeus, a butique Gallaecia de delikatessen galegas e a vizinha livraria Orfeu. C’est la vie…

Bruxelas, Janeiro de 2008, Rue des deux Eglises, restaurantezinho de cuisine portugaise. Sentam à mesa dois amigos, um deles criado entre Ferrol e Pontedeume; o outro, entre a Foz do Douro e o Porto. Vêm de ver uma magnífica exposição em Bozar sobre as descobertas do mundo e a participação portuguesa nelas. A conversa, geográfica, segue por cima de bom vinho e melhor bacalhau.

O empregado entra nela, prudente e distante ante a sabedoria que mostram aqueles “doutores”, muito viajados, e, quando se dão conta, os três estão a falar de grelos, da saudade pelos grelos. O empregado confessa que, por vezes, sem perguntar muito de onde vieram, consegue grelos na loja de legumes dum marroquino. Também se fala duma loja já clássica em Bruxelas, de clássico nome, Gallaecia, onde nunca faltam grelos em lata, preparados para matarem morrinhas estomacais.

A seguir, os amigos vão traçando o mapa do mundo onde os grelos existem para definirem país: o Ocidente asturiano, o Berço, a Sanábria, Galiza, Trás-os-Montes, o Minho, o Douro, terras ainda além do Douro. E às famosas folhas do nabo juntam peixes: principalmente bacalhau e pescada.


O da Ferrolterra lembra tempos de estudante em Madrid e recorda um túnel da estrada geral da Castela, em Vilafranca do Berço. Esse túnel, perto da entrada á Galiza oficial, era chamado “a Cortina de Grelos” quando a Europa, agora unida, estava dividida pela Cortina de Ferro.

O da Foz do Douro põe cara de transcendência para pronunciar uma frase portuguesíssima:

– Quanto português terá morrido no Japão ou na Índia a sonhar com um prato de pescada com grelos!

E o seu colega, para assombro do empregado, define, rotundo:

– A pescada com grelos é a bandeira nacional das terras que formaram a antiga Gallaecia…

Em Bruxelas constituiu-se uma “associação cultural galaico-portuguesa” de nome que não deixa lugar a dúvidas: Couto Mixto.

Da capital da União Europeia vê-se a Europa formada pelas suas regiões naturais, e pelas euro-regiões que superam as fronteiras felizmente derrubadas. Entre estas, como exemplo de esperança numa União frutífera, contempla-se a que formam o Norte de Portugal e a Galiza: terras coloridas dum verde tenro e fresco como o do legume da historieta bruxelense, abertas ao longo duma delgada raia imaginária que o Couto Mixto alargou durante séculos.

Essa euro-região está duramente marcada pelo clima e a geologia, pela geografia, pelo vinho claro e o granito escuro dos espigueiros e os paços, pela genética e a toponímia, pelas sardinhas e o polvo; por uma maneira de trabalhar calada e rija que forma parte da epopeia ibero-americana; pela fala que se fez língua portuguesa caminho do Sul e a partir de Lisboa ganhou quatro continentes.

A união das gentes entre a Ribeira atlântica do Douro e a Marinha cantábrica de Lugo é tão natural como o nevoeiro que às vezes cobre o Finis Terrae europeu e traz confusões às mentes. O seu fado comum – apesar das névoas – é viverem em rede, em contínuo movimento sobre estradas de grande capacidade e caminhos-de-ferro de alta velocidade, a fazerem negócios e cultura.

A partir do Eixo Atlántico que lhes dá comum ilusão, vai-se desenvolvendo a malha que lhes dá coesão. Naturalmente… Xavier Alcalá – Galiza in “xavieralcala.blogaliza.org

Xavier Alcalá - Eu nacín en Miguelturra, no máis seco da seca Mancha, que é parte de Castela a Nova onde se fala castelán con propiedade e graza de lingua sen dúbidas. Ese foi o meu idioma primeiro. O segundo sería o galego, Ecce Homo dos idiomas, como escribín nos fértiles vinte anos, cando tentaba ser poeta.Desde cativo souben o que era a loita desigual entre dúas linguas, e -porque algo me manda andar a contrafío- tomei partida pola dos perdedores.
Sei que isto non é un mérito senón unha cuestión de carácter, e quero deixar constancia do que penso cando xa vou vello e teño quen me agarime as barbas mentres me chama “avó”.

Fíxenme persoa en Ferrol, terra de aluvión. Son inmigrante en país de emigrantes e non dou lembrado os pagos da miña orixe fortuíta (porque a memoria dos pequenos é parcial: feita só de luzadas imposibles de situar). Como outros que tampouco recordan onde naceron, tento xustificar a vida agarrándome aos cabos da infancia que se fai adolescencia para logo ser mocidade: declaro o meu amor sen límite á Ferrolterra e ao recanto eumés.

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