Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

terça-feira, 8 de novembro de 2016

Guiné Equatorial – Uma entrada polémica na Comunidade Lusófona

Terminou há dias a XI Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP e em Portugal pudemos assistir a um coro de críticas quanto à entrada oficial da Guiné Equatorial neste espaço de excelência.

Guiné Equatorial
Num primeiro momento, as criticas até faziam algum sentido. Dizer que na Guiné Equatorial não se fala Português e esse é o denominador comum dos países integrantes ou que se trata do regime mais violento e ditatorial africano também parecia um argumento mais do que válido para sustentar a contestação. A Guiné Equatorial fez uma moratória à pena de morte por imposição portuguesa para que a sua pretensão de entrada fosse aceite mas a mesma foi feita aos EUA, à China ou ao Japão que também a praticam? Creio que não.

A referência ao facto de ser um país de língua castelhana que tem o francês como segunda língua é um impedimento mas que uso abusivo se faz dos anglicanismos nos documentos oficiais portugueses e nos media? Não teríamos então nós, para dar o exemplo que usar somente o Português? Como justificamos então a norma constante do novo Acordo Ortográfico com a introdução de “facultatividades” (i.e., possibilidade da mesma palavra ter mais do que uma grafia permitida)? Isto significa que em determinados casos, cada um pode usar as palavras “a seu bel-prazer” criando vários idiomas paralelos, se quisermos. Mas a Guiné Equatorial tem que usar o Português como língua oficial sem mais.

Guiné Equatorial
Será que poderemos considerar esse argumento válido? Se a isso juntarmos o facto de o Presidente equa-guineense já ter, segundo dizem, contratado um professor para lhe dar aulas de Português, e terem sido firmados acordos com empresas portuguesas situadas na Madeira e no Porto, e estar a ser implementado um programa de ensino de português nas escolas tendo-o já declarado como a terceira língua oficial do território a seguir ao castelhano e ao francês, rapidamente chegamos à conclusão que esse argumento não deve ser validado ainda mais se considerarmos o peso económico e de influência da Guiné Equatorial no mapa africano.

Quando ilustres nomes da nossa praça se manifestam de forma tão veemente, somos obrigados a pensar e a pesquisar um pouco mais sobre o assunto pois queremos acreditar que os dirigentes dos países integrantes da CPLP se querem reunir dos melhores parceiros por forma a fortalecer esta iniciativa.

Guiné Equatorial
Assim, analisando alguns textos e gráficos podemos chegar à conclusão que andamos todos enganados. Há um discurso muito negativo quanto à permanência da Guiné Equatorial na Comunidade e por incrível que pareça, não se prende com o facto de ser um país produtor e exportador de petróleo. Não é por isso que não querem que pertença mas também não foi por isso que aceitaram o seu pedido para a integrar.

Tal como em qualquer momento político, é preciso ler a História, enquadrá-la e depois então tentar perceber as razões que levaram a este convite e à sua aceitação e a História africana é tudo menos fácil de entender à primeira vista.

A questão africana é revestida de muitos contornos de cedências, trocas e guerras pelo controlo do território e manutenção de influência como podemos ver, no caso da Guiné Equatorial, em 1778, reinava D. Maria I, que através do Tratado de El Pardo, o cede ao Rei Carlos III de Espanha em troca de territórios no Sul do Brasil.

Guiné Equatorial
Esta troca permitiu a Portugal consolidar as fronteiras naquele território. Portugal resolve com este Tratado o seu problema no Brasil e Espanha fica assim com a sua única colónia a Sul do Sahara. Em 1968, pela mão do ditador Francisco Nguema, mais tarde destituído pelo seu sobrinho e actual Presidente Obiang através de um golpe militar, a Guiné Equatorial torna-se independente da Espanha, que não demonstrou nenhum interesse no território até à descoberta do petróleo em 1990. Foi também nessa altura que a França voltou a manifestar o seu interesse, visto a Guiné Equatorial estar inserida numa região de hegemonia francesa. Não deixa no entanto de ser curioso que os territórios só passem a ter interesse para os países europeus quando lá se encontra petróleo e seja este recurso o motivador das guerras por esse Mundo fora.

No caso particular da Guiné Equatorial, estamos perante um país que tinha a sua produção e exportação dependente do cacau, mais tarde da madeira e desde 1991 do petróleo, gás natural e seus derivados. É portanto uma economia que apesar de ter as suas fragilidades, assume um papel importante no cenário internacional dados os produtos que transacciona.

Guiné Equatorial
Esta descoberta de petróleo e gás natural na sua costa e os dividendos que daí advêm, permitem uma aposta clara na transformação económica que, por consequência, leva a uma melhoria no ensino, nos níveis básico e secundário, na saúde, através por exemplo do controlo do paludismo que era um flagelo que grassava na sociedade equa-guineense, e do aumento do tráfego aéreo.

Se consultarmos os mapas das entidades oficiais, podemos seguramente concluir que entre 1991 e 2006 a Guiné Equatorial dependia da produção e exportação do petróleo e seus derivados, atingindo em 2006 um peso máximo de 76% da estrutura do PIB do país. A estrutura deste indicador macroeconómico foi sendo alterada a partir desta data e o peso deste sector foi diminuindo ao longo dos anos, passando a contribuir, em 2015, para 45% do PIB nacional. Esta situação demonstra uma maior diversificação na composição da estrutura deste indicador macroeconómico na última década.

Convém referir que no período de 2007 a 2015 se verificaram três fases distintas relativamente à evolução do PIB: entre 2007 e 2010 há uma descida acentuada do crescimento deste indicador, passando de um crescimento positivo de 15,3% para -8,9%; de 2010 a 2012 assiste-se à recuperação do PIB, registando um máximo de +8,3% de crescimento; a partir de 2010 a tendência volta a ser negativa.

Guiné Equatorial
Nem os números nem as previsões a médio prazo são animadoras mas a Guiné Equatorial detém um manancial de matérias-primas que lhe permite sustentar uma economia baseada nas exportações para além de ser o terceiro maior país produtor de petróleo da região a seguir a Angola e à Namíbia, portanto podemos concluir que se adoptar um regime mais redistributivo da riqueza existente baseado numa economia livre e num regime mais democrático, o caminho para o desenvolvimento pode não ser tão difícil quanto se augura.

Falamos de um país que até aqui foi governado por um ditador, que praticava a pena de morte, que não tinha respeito pelos Direitos Humanos, que tinha elevados níveis de corrupção, riqueza mal distribuída, numerosos casos de morte infantil e que fazia uma aposta clara nas infra-estruturas e não nas políticas sociais. Mas ainda assim este país aceitou os pressupostos da CPLP, mudou a sua Lei interna, introduziu o português como língua oficial e está a encetar todos os esforços que lhe foram pedidos para agora que já está firmado, agir como um membro de pleno direito da CPLP.

Guiné Equatorial
Se pelo menos essa pertença der mais qualidade de vida aos cidadãos e ajudar ao desenvolvimento do país e por consequência da região e ainda ganhamos mais um país que tem a nossa Língua como língua oficial, onde é que está o problema? O que não pode, ou não deve acontecer é a Guiné Equatorial não levar a cabo as mudanças a que se comprometeu e acomodar-se ao “chapéu-de-chuva” da CPLP mas se assim não for, não vejo problema nenhum com esta adesão até porque devido a isso já outras Nações pediram para ser observadoras.

Estão a vergar a Carta de Princípios da CPLP? Talvez mas se fosse para a respeitar na íntegra e sem nenhuma flexibilidade, esta Comunidade jamais poderia ambicionar ser um bloco económico e ia ficar para sempre encerrada nas fronteiras auto-impostas pelos seus Fundadores. Luísa Vaz – Portugal

(A autora não usa o Acordo Ortográfico)

Luísa Maria Teixeira Vaz - Natural da cidade do Porto, licenciada em Estudos Europeus pela Universidade Aberta com formação em Relações Internacionais pela Universidade do Minho. Fundadora e escritora num blog de opinião chamado "As Opiniões da Lu" onde são expostos pontos de vista sobre temas da actualidade de forma livre e sem amarras. Participa na coluna Ágora Lusitana do blog Rua da Constituição com uma opinião mensal e tem uma participação quinzenal no blog BIRD Magazine. É também fundadora e blogger no Insónias.


Está neste momento a preparar uma compilação de todos os seus artigos em formato e-book que se prevê seja lançado ainda este ano. Profissionalmente esteve ligada à revisão e publicação de obras numa Editora bem como realiza trabalhos de tradução e retroversão em várias áreas de conhecimento. Colabora no blogue “Baía da Lusofonia”

Guiné Equatorial

1 comentário: