Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Galiza na CPLP?



Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) acaba de celebrar os 21 anos da sua criação com algumas decisões que, não implicando uma mudança essencial, podem gerar novas dinâmicas e expectativas.

A última reunião do Conselho de Ministros, realizada o passado 20 de julho em Brasília, produziu duas novidades de interesse em relação aos “observadores associados”, países que não entram no grupo restrito dos membros de pleno direito, e os “observadores consultivos”, categoria reservada às entidades da sociedade civil.

No primeiro caso, o Conselho de Ministros adotou uma «Resolução sobre o reforço da cooperação com os observadores associados» que pretende dar um papel mais claro a estes países membros, até ao presente num papel limitado. Com esta decisão promove o acesso dos seus representantes aos expedientes internos, e a sua implicação nas políticas comuns, por meio da participação em reuniões do Comité de Concertação Permanente e o Conselho de Ministros, em fórmulas que ainda terão de ser estabelecidas. Desse modo os associados, como a Turquia, Senegal, Uruguai, Japão ou a Maurícia, adquirem maior margem de manobra em termos políticos e diplomáticos, o que acarreta simultaneamente o alargamento da CPLP em termos de capacidade de atuação em cenários que vão além do espaço de língua oficial portuguesa.

As discussões sobre o alargamento da CPLP e as dúvidas que suscita a entrada de novos países “não lusófonos”, são temas que têm vindo a ser comentados na comunicação social de Portugal com relativa frequência. O assunto vai muito além da questão da Guiné Equatorial e do seu processo de admissão, primeiro como país associado, depois como membro de pleno direito. Equaciona-se entre manter a organização estritamente no território de língua portuguesa, como oficial ou de herança, ou o estabelecimento de fórmulas de integração e colaboração de países que, sem ter uma relação direta com a nossa língua, mostram interesse em fazer parte do conjunto lusófono, por diversos motivos. Por outras palavras, a escolha situa-se entre manter a CPLP no atual espaço, ou promover um alargamento que a converta num ator com peso a larga escala.

Quanto aos observadores consultivos, a CPLP adotou uma resolução em que foi aceite a Academia Galega da Língua Portuguesa, com o patrocínio do Governo da República de Angola. A decisão fecha o périplo desta candidatura galega, apresentada em 2011, e vem reconhecer o papel da sociedade civil neste processo, dispondo agora de um interlocutor direto nesse organismo internacional.

É possível entrar na CPLP?

Isso não significa a entrada formal da Galiza na CPLP. Poderia ser admitida, em determinadas condições. Os galegos fomos consultados, através das Irmandades da Fala da Galiza e Portugal, em 1989, por iniciativa do Governo do Brasil, sobre o processo de criação do Instituto Internacional da Língua Portuguesa. E novamente em março de 1993, na ronda de consultas sobre a criação da CPLP, por iniciativa do Embaixador José Aparecido de Oliveira, como pode ser observado na documentação da Comissão Galega do Acordo Ortográfico, de que a Academia Galega da Língua Portuguesa é depositária.

Em segundo lugar, diversos governos galegos tiveram atuações em direção à CPLP. Isso aconteceu durante as presidências de Manuel Fraga e Emílio Pérez Touriño. Como sabemos, com resultados insatisfatórios. Em 1989, porque a redação inicial do projeto, concebido como comunidade de povos, se converteu em comunidade de estados, o que impossibilitou formalmente a admissão da Galiza. Contudo, os estatutos incluíram um parágrafo para a entrada como observadores associados de «entidades territoriais dotadas de órgãos de administração autónoma». Posteriormente, durante a presidência de Touriño, falhou a negociação com o Ministerio de Asuntos Exteriores da Espanha, provavelmente porque não fora preparada adequadamente.

Lei Paz-Andrade

A lição dessas experiências apontava para a necessidade de procurar um grande acordo político e social, reunindo apoios para retomar essa iniciativa. Isso implicava que os principais motores das políticas antilusófonas nas décadas de 1980 e 1990, instauradoras do modelo isolacionista para o galego, deveriam chegar, de alguma forma, a algum entendimento com o reintegracionismo. Isto aconteceu, parcialmente, com a Iniciativa Legislativa Popular Paz-Andrade, convertida em lei do Parlamento da Galiza em março de 2014.

A lei fornece um instrumento valioso para desenvolver as políticas tendentes a essa integração na Lusofonia. Porém, aos três anos da sua aprovação, há vários riscos que ameaçam gravemente o processo, como o facto de não ter-se criado uma só vaga para professores de português no ensino público, o que é um claro incumprimento dos acordos e produz frustração nos milhares de pessoas assinantes da ILP. Outro risco não menos importante é a inexistência de uma comissão oficial de trabalho sobre a aproximação da Lusofonia, como se sugeriu no Parecer sobre o Desenvolvimento da Lei Paz-Andrade, documento imprescindível que deveria servir como roteiro.

Contrariamente ao declarado por representantes do Governo, a política linguística é observada com atenção no Palácio dos Condes de Penafiel. Apresentar o galego como língua “intercompreensível”, mas “independente do português” coloca a Galiza, simbolicamente, da parte de fora. E quem se põe de fora dificilmente pode sentar-se à mesma mesa. Paralelamente, não pode pedir-se a entrada na CPLP e, ao mesmo tempo, manter a tradicional política de exclusão das pessoas e entidades da sociedade galega que publicam em português. Na ausência de movimentos do Governo e instituições involucradas, a participação direta da sociedade civil galega na CPLP só poderia deixar em evidência a deterioração das expectativas geradas com a própria Lei Paz-Andrade. Ângelo Cristóvão – Galiza in “Novas da Galiza”


José Ângelo Cristóvão Angueira (Santiago de Compostela, 1965), licenciado em Psicologia pela Universidade de Santiago, especializou-se em Psicologia Social. Empresário. Vice-Presidente da Academia Galega da Língua Portuguesa e membro da sua Comissão de Relações Internacionais. Sócio Correspondente da Academia das Ciências de Lisboa; Sócio da AGAL desde 1983 e Sócio fundador da Associação Internacional dos Colóquios da Lusofonia.

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