Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

China - Certificação em Português aquém da expansão do ensino

A China tem investido cada vez mais no ensino da língua portuguesa, nomeadamente devido às relações comerciais com vários países lusófonos. No entanto, as oportunidades de certificação profissional necessária a quem pretende exercer as funções de tradutor ou outras semelhantes não acompanham a crescente procura. A conclusão é de Ye Xinlei que na sua tese de mestrado na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa aponta ainda vários motivos para as actuais circunstâncias. A RAEM surge como ponto determinante para fazer face a estes problemas

O desenvolvimento da certificação de Português Língua Estrangeira (PLE) “não acompanha o ritmo da expansão do seu ensino e aprendizagem”. A ideia é defendida por Ye Xinlei, na sua tese de mestrado “O Português na China: alguns aspectos do seu ensino-aprendizagem e avaliação”, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

A tese destaca que esta situação tem vários motivos, entre eles “a imperfeição do sistema de ensino da Língua Portuguesa”. “Sendo uma língua estrangeira pouco utilizada emergente na China, o sistema de ensino de PLE está na fase de exploração e melhoramento, enfrentando vários desafios”, refere.

O primeiro problema apontado prende-se com a qualidade dos docentes. “O nível dos docentes influencia directamente a aprendizagem dos alunos. Actualmente há uma escassez de docentes doutorados na área da Língua Portuguesa, como tal, a procura de docentes qualificados torna-se uma tarefa difícil”, frisa Ye Xinlei.

Por outro lado, “os meios académicos internos constituem elementos cruciais para o desenvolvimento dos cursos oferecidos”. “Nos últimos anos, tem sido dada uma crescente valorização a estes dois aspectos, enquanto a avaliação e a certificação de PLE tem sido menos valorizada”.

Ao mesmo tempo, há uma diferença entre a oferta e a procura. “As enormes potencialidades de troca bilateral entre a China e os países de Língua Portuguesa exigem uma grande quantidade de mão-de-obra, designadamente pessoal qualificado em português para preencher as vagas no mercado lusófono”. “Porém, continua a existir carência de pessoas especializadas neste mercado”. Assim, refere Ye Xinlei, formar e oferecer quadros qualificados “tornam-se uma prioridade”.

Além disso, é referida “a situação embaraçosa em que se vêem alguns dos graduados em português”. “Por vezes, as suas competências estão longe de ser capazes de satisfazer os requisitos cada vez mais exigentes de uma sociedade plural”. “O que a sociedade procura são pessoas versáteis, que se conseguem adaptar rapidamente a diferentes circunstâncias de trabalho e tratar calmamente de assuntos vários”.

Uma das preocupações prende-se com o facto de, nos cursos de licenciatura, não se apostar no estudo de aspectos técnicos e de áreas profissionais específicas, “pelo que os graduados nem sempre dispõem de capacidades de resolução de problemas técnicos”. “Esta situação tem levado a que muitas empresas mandem os funcionários técnicos internos estudar Língua Portuguesa, em vez de recrutar graduados em Português, por isso, um certificado de conhecimentos linguísticos não é visto como essencial neste contexto e, consequentemente, a certificação não é tão valorizada como podia ser”.

“Perante o elevado número de instituições que fornecem cursos de língua portuguesa, a escassez de instituições que aplicam exames de certificação de PLE internacionalmente válidos reflecte uma desvalorização do reconhecimento das competências linguísticas, fazendo com que o sistema do ensino e aprendizagem de PLE na China perca equilíbrio académico”, refere o texto.

Para abrandar este fenómeno, considera que é preciso levar a cabo investigação em termos dos graus de dificuldade da LP para aprendentes chineses, “formular critérios rigorosos de avaliação e selecionar lugares apropriados para os exames, o que exige um longo caminho a percorrer”.

Por forma a colmatar estes problemas, Ye Xinlei aponta um factor importante: a “crescente influência e reputação internacional da RAEM promove de forma positiva o estatuto internacional da China e a vontade dos estrangeiros” de conhecer o país. “Reciprocamente, a China Interior esforça-se para desenvolver um intercâmbio dinâmico com este território e intensificar uma relação de proximidade”, frisa.

Na sua perspectiva, “os contactos da China Interior com a RAEM estão inevitavelmente relacionados também com a Língua Portuguesa, em especial, com o papel que as instituições de Macau têm assumido no desenvolvimento do ensino e na formação de professores de Língua Portuguesa”.

Alunos são adultos

Tendo em conta que o Português não possui a influência da língua inglesa na China, o ensino e aprendizagem de PLE na China têm como público maioritariamente os adultos. “Com a crescente procura de quadros especializados em Língua Portuguesa para o mercado laboral e as relações externas, surgiram cada vez mais universidades e instituições que oferecem cursos de Língua Portuguesa, contudo, devido à falta de experiência de ensino e de professores qualificados, o ensino de PLE tem enfrentado vários desafios”, adverte.

Ye Xinlei sublinha que, para superar as dificuldades e manter a dinâmica de aprendizagem da língua, “as instituições desenvolveram uma série de planos como intercâmbio académico, bolsas de estudo e debates interuniversitários”. Não obstante o progresso do ensino e aprendizagem da língua, a certificação demonstra “um contraste acentuado”. “A característica mais óbvia é a reduzida existência de instituições que oferecem a certificação de PLE”.

“Hoje em dia, possuir uma certificação é uma vantagem absoluta no ambiente de competição intensa. Ter um certificado de Língua Estrangeira significa obter mais opções de trabalho e oportunidades de promoção”.

Em jeito de conclusão, Ye Xinlei defende que o ensino/aprendizagem e a avaliação/certificação constituem, em conjunto, o sistema de ensino de uma língua estrangeira. “Embora sejam partes independentes e tenham a sua própria metodologia, complementam-se no processo de aperfeiçoamento. O progresso de qualquer um não pode ser obtido em detrimento de outro”.

Nesse sentido, “o que a sociedade chinesa deve fazer hoje é garantir a qualidade dos docentes”, isto é, “ter uma exigência rigorosa em relação aos seus diplomas e qualificações, definir cursos adequados, oferecer recursos extracurriculares como actividades de visita à Embaixada ou Consulado de Portugal, do Brasil ou de Angola, se for possível, debates em português com outras Universidades, criar mais postos de certificação de PLE e desenvolver a investigação neste campo”.

Até ao momento foram criadas 17 delegações do Instituto Confúcio no mundo lusófono. Em contrapartida, existem mais de 20 universidades que oferecem cursos de Português na China. De qualquer modo, sustenta Ye Xinlei “o progresso do ensino e aprendizagem e da formação do PLE na China é indissociável das relações políticas, económicas e comerciais que se tornam cada vez mais estreitas entre a China e os países de Língua Portuguesa”. Inês Almeida – Macau in “Jornal Tribuna de Macau”

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